Conheça a opinião de especialistas em gestão fiscal e tributária a respeito da reforma que está por vir
Em tempos de recessão econômica, um dos assuntos que não saem da pauta dos governos federal, estaduais e municipais é o ajuste fiscal. Na teoria, ele é simples: devo arrecadar mais do que gasto para manter saudáveis as contas públicas e criar as bases para a retomada do crescimento da economia; na prática, é um caos: como sabemos, o sistema tributário brasileiro é o mais complexo do mundo, contendo milhares de normas – dezenas delas editadas diariamente –, o que impede a eficiência tanto do pagamento, por parte das pessoas físicas e jurídicas, como do recolhimento, por parte do Estado. Além disso, prejudica a transparência e inibe investimentos, fatores que contribuem para o agravamento da crise.
Nesse sistema tributário, podem ser selecionados, ainda, alguns impostos que suscitam mais dúvidas que outros. Ou seja, são os mais complicados dentro do sistema mais complicado do mundo. Haja complicação! E, sim, estou falando do PIS e da COFINS!
Mas não é à toa que são alvo de polêmica. O PIS (Programa de Integração Social) e a COFINS (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) representam parcela significativa da arrecadação tributária da administração federal, por isso frequentemente lemos a respeito deles nos jornais, seja porque o governo alvitrou uma mudança, porque o poder judiciário aprovou ou indeferiu alguma proposta, ou até porque empresas entraram com ação para alterar as bases de cálculo. É uma arena em que os atores brigam diariamente para puxar a brasa para sua sardinha.
É de se imaginar, portanto, que, com o arrefecimento da atividade econômica e a consequente queda na arrecadação do governo, essa arena esteja mais inflamada. Novidades vêm por aí: a alta cúpula da equipe econômica de Temer sinalizou que apresentará proposta de reforma na tributação do PIS e da COFINS. Apesar de ainda haver muitas dúvidas em relação ao conteúdo dessa reforma, podemos arriscar, pelo menos em linhas gerais, alguns palpites. Confira, abaixo, as respostas de especialistas com quem conversamos às seguintes perguntas:
Quais suas expectativas para as reformas na legislação do PIS e da COFINS?
Se suas previsões estiverem corretas, você considera que seria a reforma ideal?
E, se não, o que você considera uma reforma ideal?
Vando Oliveira, tax director na Coty e presidente do conselho deliberativo do Confeb
Minha expectativa é que haja uma simplificação geral na legislação, em especial na questão da possibilidade de creditamento por parte das empresas. Hoje há inúmeras discussões acerca do que pode ou não ser base de cálculo para crédito de PIS e COFINS, e isso gera um contencioso tributário gigantesco, o que é ruim para as empresas e para o governo (é bom apenas para os consultores). Além disso, seria ótimo também que houvesse uma unificação do PIS com a COFINS, com alíquotas e regras únicas.
Devemos considerar que, no nosso cenário atual, seria necessária uma reforma tributária geral. Porém, isso não vai acontecer. Há outras prioridades no governo, tais como reforma previdenciária e a Lava-jato e, sem dúvida, reforma tributária não ocorrerá da maneira como deveria ocorrer. Assim, temos que partir do pressuposto que teremos uma mini-reforma desses únicos impostos, PIS e COFINS. Com base nesse pressuposto, se minhas previsões estiverem corretas considero um grande avanço. Novamente, não vai resolver todos os problemas, mas espero que pelo menos diminua o contencioso tributário, que é um problema para as empresas e para nosso país. Considero que o ideal seria que os dois tributos fossem unificados, que todas as aquisições pudessem dar direito ao crédito de PIS e COFINS, e que também acabassem com a quantidade de regimes e exceções que temos (monofásico, cumulativo e não-cumulativo). Deveríamos ter uma regra única e eventuais exceções deveriam ser tratadas com alíquotas diferenciadas (cesta básica, por exemplo, poderia ser alíquota zero, ao passo que itens não essenciais, alíquotas maiores). Desse modo, seguiríamos a regra da essencialidade praticada na legislação do IPI e do ICMS.
Carlos Eduardo Lopes, head of tax da Pernod Ricard Brasil e conselheiro do Confeb
Minha expectativa é que haverá sobrecarga tributária em alguns setores, como trading ou serviços, por exemplo. Isso porque a pretensão da administração fazendária é expandir a sistemática de não cumulatividade, ampliando a base de tomada de créditos e consequentemente majorar a alíquota do tributo incidente sobre as receitas como forma de “compensação”. Setores da indústria com maior margem de EBITDA (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) certamente serão os mais impactados.
Em relação às contribuições para PIS e COFINS, a reforma ideal deveria setorizar a incidência das contribuições para aplicação de alíquotas diferenciadas, visando a equilibrar a sistemática da não cumulatividade. Por exemplo, setores com menos insumos e serviços agregados ao produto teriam menor alíquota, enquanto que setores com maior percentual agregado de insumos e serviços teriam maior alíquota. Setores de serviços e indústria teriam alíquotas diferentes visando a equilibrar a carga tributária.
Pedro Casquet, Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas e professor do Confeb
Pelo que tem sido anunciado pelo governo, a reforma do PIS e da COFINS passará necessariamente pela criação de um sistema não-cumulativo único, com redução da alíquota e com uma maior permissividade em relação aos créditos possíveis de serem escriturados, que hoje têm muitas restrições. Essa já era a pretensão do governo quando foi criada a sistemática não-cumulativa em 2003, que hoje é aplicável, primordialmente, para as pessoas jurídicas que estão submetidas ao Lucro Real (com faturamento superior a R$ 78 milhões). À época, por questões meramente arrecadatórias, não havia ambiente político para uma alíquota menor e um sistema mais racional dos créditos. A grande questão da reforma, em meu sentir, é saber se as empresas que atualmente estão submetidas ao PIS e à COFINS na sistemática cumulativa, que despreza os créditos, estarão aparelhadas para um novo número de obrigações acessórias decorrentes desta nova sistemática, que demandará uma contabilidade infinitamente mais elaborada.
A reforma pretendida pelo governo está longe de ser a ideal. Para sê-lo, primeiramente deveria haver a unificação das contribuições, com a extinção de todos os regimes diferenciados. A criação de um sistema justo e racional que previsse uma forma mais simples de contabilização e menos dúvidas sobre a possibilidade de tomada de créditos seria um bom início para a almejada reforma. A elaboração de um sistema simples de contabilização permitiria, inclusive, que este fosse aplicado para as micro e pequenas empresas submetidas ao Simples Nacional, que se tornou um regime tão nefasto, que hoje mais atrapalha do que incentiva o pequeno empresário, grande gerador de empregos e riqueza do país. Uma reforma digna para o PIS e para a COFINS, inclusive, passaria por seu alinhamento em relação à tributação estadual e municipal, devendo-se ter em conta que a arrecadação destas contribuições têm como grande mote o financiamento da seguridade social e não funcionar como instrumento de regulação do consumo ou da criação de superávit primário.
Elisabete Gonçalves, tax director do Walmart e conselheira do Confeb
A expectativa é que haja unificação dos tributos, visto que são tributos distintos com fato gerador e base de cálculo praticamente iguais. Espera-se que a reforma também traga uma simplificação da legislação que hoje é muito esparsa e repleta de especificidades.
Entendo que a reforma não é a ideal. Para ser ideal – focando única e exclusivamente no PIS e na COFINS – teria de trazer a não-cumulatividade pura, unificação e alíquota única, independentemente do produto ou setor.
De fato, o assunto não é simples. Não há consenso, nem mesmo entre os especialistas, sobre o que está por vir. E nem haveria de ser assim, dada a complexidade do assunto e da agenda do governo, que tem muitos problemas a resolver e poucos canais para fazê-lo.
É consensual, todavia, que, qualquer que seja a reforma pretendida, está longe de ser a ideal.
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Também é consensual a importância de ficar atento ao blog do Confeb para se manter atualizado sobre as tendências do mundo fiscal e tributário! :D