A promulgação da Lei Complementar nº 214/2025 instituiu um novo paradigma fiscal no Brasil com a criação da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Dentro do regime diferenciado concedido à Zona Franca de Manaus (ZFM) e às Áreas de Livre Comércio (ALC), o mecanismo do crédito presumido surge como um instrumento de vital importância. Ele visa tanto fomentar atividades econômicas específicas quanto garantir a competitividade dos produtos originários dessas regiões.
Diferentemente da suspensão ou da alíquota zero, o crédito presumido funciona como um incentivo financeiro concedido ao contribuinte sob determinadas condições, gerando um crédito fiscal a ser utilizado na apuração dos tributos. A nova legislação estabelece diversas hipóteses para a concessão desses créditos, cada qual com suas particularidades de cálculo e aplicação.
I – Crédito Presumido na Importação para Revenda (Art. 444 e 462)
Visando o fomento da atividade comercial local, a legislação estabelece um crédito presumido de IBS para bens importados que se destinem à revenda presencial na Zona Franca de Manaus e nas Áreas de Livre Comércio. O valor deste incentivo fiscal é apurado pela aplicação de um percentual de 50% sobre a alíquota do IBS que incidiria na operação de importação, o que representa uma redução efetiva na carga tributária da internalização dessas mercadorias destinadas ao comércio.
A aplicação deste benefício, contudo, é estritamente condicionada. Tomando como referência o art. 11, § 1º, I da Lei Complementar, a norma define "operação presencial" como aquela em que a entrega ou a disponibilização do bem acontece com a presença física do adquirente no estabelecimento do fornecedor. Essa delimitação é crucial, pois restringe o incentivo ao comércio físico local, excluindo, por consequência, as operações de venda a distância e o comércio eletrônico.
II – Crédito Presumido na Aquisição de Bens Nacionais (Art. 447 e 465)
Quando um contribuinte habilitado na ZFM ou ALC adquire um bem material industrializado de origem nacional, que foi beneficiado pela redução a zero da alíquota do IBS em sua remessa (art. 445 e 463), ele tem direito a um crédito presumido deste imposto. O cálculo do crédito varia conforme a procedência do bem:
III – Crédito Presumido em Operações com Bens Intermediários na ZFM (Art. 449)
Com o objetivo de promover a verticalização da cadeia produtiva local, o Art. 449 concede um crédito presumido de IBS de 7,5% às indústrias incentivadas na Zona Franca de Manaus. Este crédito incide sobre o valor de aquisição de bens intermediários que foram produzidos na própria ZFM, beneficiados pela alíquota zero e destinados à produção de bens finais. O benefício também é aplicável sobre o valor adicionado na industrialização por encomenda. Vale ressaltar que este incentivo específico não está previsto para as Áreas de Livre Comércio.
IV – Créditos Presumidos na Saída para o Território Nacional (Art. 450 e 467)
Quando bens produzidos na ZFM ou ALC são vendidos para outras regiões do Brasil, a operação segue a tributação comum, mas com a concessão de créditos presumidos de IBS e CBS para garantir sua competitividade. A sistemática é a seguinte:
IV.I – Crédito Presumido de IBS (Exclusivo para a ZFM)
Os percentuais incidem sobre o saldo devedor do imposto no período de apuração e variam conforme o tipo de bem:
· 100% para bens de informática e para produtos que, até 31 de dezembro de 2023, possuíam crédito estímulo de ICMS neste mesmo percentual no Estado do Amazonas.
IV.II – Crédito Presumido de CBS (ZFM e ALC)
Os percentuais incidem sobre o valor da operação registrado em documento fiscal:
V – Regra de Transição (Art. 474)
É fundamental observar que a Lei Complementar estabelece uma redução gradual para determinados créditos presumidos. Conforme o Art. 474, os percentuais previstos nos artigos 447, 449 e 465 serão reduzidos durante o período de transição, entre 2029 e 2032, nas seguintes proporções:
VI – Considerações Finais
A sistemática de créditos presumidos instituída pela Reforma Tributária para a ZFM e ALC é um pilar complexo e multifacetado do novo regime diferenciado. Cada modalidade de crédito possui uma finalidade estratégica, seja para fomentar o comércio local, fortalecer a indústria interna ou assegurar que a produção da região possa competir em igualdade de condições no restante do território nacional. A compreensão detalhada dessas regras, incluindo as normas de transição, é decisiva para o planejamento tributário e a segurança jurídica das empresas que atuam nessas importantes zonas de desenvolvimento.
* Lucas Moreira é Advogado e Consultor Tributário, com especialização em Impostos Indiretos e integra o time de Conteúdo da Systax.