A relação entre fisco e contribuintes no Brasil pode ser considerada como de adversários? O paradigma punitivo da correção pelo auto de infração pode mudar?
Essas são algumas das questões que rondam a relação entre pagadores de impostos e as autoridades fiscais no País.
Apesar dos conflitos tributários não serem uma exclusividade brasileira, o assunto tem um destaque especial por aqui. Não é por acaso que temos um dos maiores contenciosos tributários globais e somos o País que mais gasta horas dedicadas ao cumprimento de obrigações acessórias.
Para jogar um pouco de luz nessa história, confira as entrevistas de 3 especialistas em tributos.
Melissa Scarpelli – Diretora do Departamento Legal (Dejur) da Fiesp
Estou na área Tributária há 12 anos e sempre vi o fisco como "sócio majoritário" dos contribuintes, pois a sistemática tributária foi criada para aplicar sanção e perda do patrimônio de modo muito eficiente, em caso de descumprimento das obrigações acessórias ou mesmo falta/ atraso no pagamento dos tributos.
No entanto, recentemente, as Autoridades Fazendárias, por almejarem ingressar na OCDE, seguir regras internacionais contábeis, observar o BEPS, e em razão da crise, passaram a entender que o Contribuinte pode ser um parceiro na arrecadação, no desenvolvimento de um país e na captação de investimentos estrangeiros.
Ora , nenhum investidor deseja estar num país em que o devido processo legal (mesmo o de cobrança) não seja respeitado.
Portanto , entendo que o fisco está aprimorando, via investimento em TI e novas obrigações (EFD, REiNF, Nos Conformes...) , os meios de controle das obrigações a fim de aumentar a arrecadação.
A relação Autoridade Fazendária x Contribuinte poderá melhorar quando:
(I) as Reformas Tributária e Previdenciária forem aprovadas. Não há plausibilidade de cumprir aproximadamente 90 obrigações por mês, por empresa; precisamos simplificar processos, ter leis mais efetivas;
(II) quando as regras fiscais não forem alteradas abruptamente, ou seja, faço adesão a um parcelamento e depois o benefício é unilateralmente revogado . Seguranca Jurídica é um pilar para que empresas produzam, lucrem e arrecadem da melhor forma;
(III) quando os controles impostos pelo fisco forem razoáveis, ou seja , o contribuinte paga tempestivamente seus impostos mas ao entregar uma GIA em atraso tem sua nota rebaixada. Talvez este não seja um critério razoável.
O projeto “Nos conformes” é uma tentativa de cooperação fisco x contribuinte uma vez que tem sua origem nos moldes internacionais, ou seja, o fisco auxilia , educa e ajuda o contribuinte no cumprimento da obrigação tributária e pagamento dos tributos. Talvez nosso modelo de repressão esteja desgastado. No entanto, precisamos criar parâmetros melhores para ranquear os contribuintes a fim de que injustiças não sejam cometidas.
Dalton Miranda – Colunista do site Jota e Consultor do escritório Trench, Rossi e Watanabe
Na esfera federal, sim, tenho bastante clara a percepção de que para a RFB o contribuinte é "o inimigo a ser derrotado". Tomo por exemplo, e a justificar minha colocação, o tratamento dispensado aos contribuintes pela Portaria RFB 1750/18, os julgamentos à qualidade contra as teses dos contribuintes pelas Turmas da CSRF/CARF, e as manifestações lançadas pela RFB e em seu 'site' sobre aquilo quanto considera ser um Planejamento Tributário Abusivo (PAT).
Creio que uma das possíveis soluções seria a promoção de uma efetiva, eficaz e transparente reforma do sistema tributário.
Sim, acredito que programas como o da SEFAZ/SP podem servir de instrumento colaborativo na relação fisco x contribuinte.
Kleber Santos – Sócio-Tax Director | MF Contadores Associados
Entendo que se faz necessário realizamos algumas ponderações para ordem de esclarecimento. O sujeito ativo, nomeado como “fisco”, possui uma função muito emblemática e de grande responsabilidade perante a sociedade, pois fiscaliza os recolhimentos de tributos e busca aplicar com rigor a legislação. Por outro lado, temos o sujeito passivo nomeado “contribuinte”. Ocorre que sistematicamente alguns contribuintes burlam o que a Lei determina, logo gerando um conflito no que é disciplinado pela Lei. Temos que concordar, a carga tributária do Brasil é abusiva, mas isso não daria o direito aos contribuintes para burlarem a legislação, pois ela tem a finalidade essencial de arrecadação dos tributos, que são destinados ao desenvolvimento do País.
Acredito que a burocratização seja a maior queixa dos contribuintes. Para apurar seus tributos e declará-los a vigor, tem-se um pavor e uma insegurança constantes, pois o contribuinte muitas vezes tem dificuldade de aplicar tudo o que é determinado.
Entendo que esse projeto vem para somar, tanto para o contribuinte, como para o fisco. O contribuinte será estimulado a seguir as premissas básicas, como pagar os impostos, entregar as declarações acessórias e ainda terá diferenciação no atendimento junto ao fisco. O fisco terá condições de ser mais justo com os contribuintes que seguem as boas práticas. Obtendo assim, favorecimentos na devolutiva de solicitações.
Se você pensa em se capacitar mais na área de tributos para enfrentar esses desafios, um bom lugar para começar é conhecer os cursos da Confeb, a escola de Tributos da Live University. Lá você vai encontrar workshops, eventos, especializações e os programas do nosso MBA em Gestão Fiscal e Tributária. Não deixe de conferir.